A criança mais sensível tem uma falta maior de atenção e
cuidados. E assim ela se torna mais carente e quando os pais, por razões
diversas, não podem lhe dar o que necessita isso produz em seu ser uma sensação
de abandono, que produz a mágoa. A mágoa continuada gera o ódio e a revolta.
Por sentir-se “abandonada” a criança cresce achando-se sem “dono”, sem norte
definido, sem um porto seguro que possa lhe prender a uma “terra” firme para
construir o seu projeto de vida. A bandeira que ela carrega está sem cor
definida, sem símbolo significativo a lhe prender a um sentido salutar e
perene. Não há valores importantes, sagrados a serem seguidos. Tudo o que vier
será válido, então.
Quando chega à adolescência, a pessoa atingida por essas
experiências fica a mercê de quem lhe dá atenção e carinho, seja quem for e
sejam quais forem as suas intenções (mesmo as piores para a pessoa “desprezada”
pelos seus entes queridos). A “valorização” de si por pessoas estranhas ao seu
grupo familiar faz aumentar a distância entre o adolescente insatisfeito e seus
pais, faz piorar a impressão negativa do adolescente para com as pessoas do seu
círculo familiar e o faz supervalorizar “o gostar sem impor condições” de
outras pessoas, fazendo esse adolescente “apagar” todos os defeitos da índole
dessas pessoas, a ignorar a má qualidade de suas naturezas. O adolescente em
questão passa a personificar (a assimilar o que) as qualidades negativas dessas
pessoas a fim de cada vez mais receber a sua aprovação e “amor”. O adolescente
desajustado emocionalmente acha-se “insuficiente” para ser aceito e amado pelos
pais e consequentemente por seus familiares. Então passa a aceitar e aprovar os
desaprovados para que possa facilmente ser aceito e querido.
Ele passa então a formar uma identidade, um perfil a partir
do modelo das pessoas que lhe “acolheram” tão encarecidamente, após o seu
conflito familiar, que gerou o conflito interior de existência e de identidade.
O adolescente que se sente infeliz e que põe a culpa nos pais sempre procura
amizade com pessoas “resolvidas” nessa questão para se abrigar e a superar.
Para tanto se ampara em pessoas que desprezam as regras estabelecidas pelos
pais, que transgridem padrões impostos por aqueles que os fazem “sofrer”. Assim
sente que anulou o conflito, contornando o sistema educacional “opressor”
tomando partido contrário aos seus “inquisidores”, não deixando mais a sombra
inquietante da dúvida lhes incomodar. Decide-se definitivamente pelo profano,
ou melhor: pelo moderno, já que o sagrado lhe é desconhecido. Nada mais é
especial. Torna-se ativo combatente prático do modelo tradicional que
atualmente combate o sistema inimigo apenas na teoria, o sistema da
desagregação familiar e social.
O adolescente em conflito interior procura os outros
“rebeldes” porque os vê como pessoas fortes, decididas, resolvidas que
estabelecem um novo modelo de relação familiar e interpessoal: o da
transgressão ao que lhe incomoda e “diminui”, o do enfrentamento àqueles que o
“desprezam”, que não foram capazes, pelo caminho do amor padrão, de lhes fazer
felizes. O adolescente desgarrado de suas origens envereda pelo caminho do
livre querer, do bel prazer e do não compromisso com o modelo que lhe “feriu”.
Esse “descaminho” se torna o seu caminho para crescer, embora esse seja o
caminho da dor. Não mais o da dor emocional, transitória, mas o da dor real,
permanente porque evolui para o psicológico e espiritual.
Após esse adolescente trilhar uma longa jornada no caminho da
transgressão, da rebeldia, do abandono de si mesmo (quando pensava tomar as
rédeas do seu destino), continuará culpando os pais por todo o seu fracasso
social e pessoal.
Alberto Magalhães
Alberto Magalhães
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