Por Marcos Vinicius Gomes*
Maitê Proença em recente entrevista no site do Estadão tratou de vários assuntos envolvendo sua carreira, sua vida familiar, projetos e política. Em determinado trecho da entrevista Maitê disse que o machismo brasileiro poderia salvar o país da eleição de Dilma Rousseff para a presidência da república. Esta observação - considerada retrógrada por envolver um problema que é a raiz de problemas sociais históricos no Brasil - causou indignação em vários lugares, principalmente em blogs de esquerda como o de Paulo Henrique Amorim.
Interessante notar que apesar de toda esta polêmica da fala da atriz, que foi oportunamente usada de modo pejorativo pela oposição para denunciar uma suposta apologia à violência doméstica, ao estupro, ao assédio sexual e moral, males que afligem não só mulheres em si, mas toda a sociedade e que tem raiz no machismo, essa denúncia, apóia-se na demagogia partidária que nos ronda atualmente, este clima de torcida que está mais forte do que nunca nestas eleições, inclusive na mídia.
É interessante ainda o fato de Maitê apoiar Serra e de receber pensão permanente por morte dos pais que eram funcionários públicos de São Paulo, mesmo sendo casada. Isso porque, como se sabe, o partido dos tucanos não tem afeição pelos benefícios sociais conquistados, usando o argumento do 'estado mínimo' em tudo: na saúde, na educação, nos transportes (com pedágios), na segurança, na previdência. FHC em seus tempos áureos de presidente afimou que os aposentados 'jovens' eram 'vagabundos', num discurso onde defendia a reforma da previdência.
Mas voltando ao tema demagogia de ambos os lados - da esquerda que afirmou coisas supostas na fala de Maitê, e da direita que quer apenas beneficiar o lado de cima da pirâmide social (Maitê com sua pensão de R$ 13.000,00 é certamente um ícone direitista), queria focar na posição demagógica que é geralmente vista entre todos nós, sejamos de direita, esquerda ou centro. Maitê afirmou que o machismo poderia 'salvar' o país de eleger Dilma e possivelmente quando fez essa afimação não pretendia dizer que homens brutos ou mulheres alienadas que admitem que o homem 'pode fazer o que quiser com elas' iriam até as urnas para impedir uma possivel eleição da candidata petista. Evidente que ela não teve essa intenção. Entretanto a fala conservadora da atriz, talvez traga um ranço que tem nos ajudado em situações onde não vemos alternativas a curto prazo e que alimentam o 'jeitinho brasileiro' ou o 'jeitinho de pensar brasileiro' para situações menos desgastantes possíveis.
Uma situação como exemplo. Quantos já não presenciaram na mídia, crimes hediondos de violência sexual contra mulheres ou crianças e quando na captura do criminoso há um coro que diz: "Que bom, agora ele será 'donzela' na cadeia" - isso devido a um 'código de honra' entre presidiários, que não aceita estupradores entre eles e que pune com violência condenados por crimes sexuais. E quando alguém se posiciona desfavorável a esse 'código de honra da prisão' é visto como 'imoral', 'condescendente com maníacos', etc. Isso seria uma variante do 'jeitinho brasileiro', onde se exalta a violência para conter a violência, onde se deseja corrigir a estupidez com doses reforçadas do mesmo remédio.
Essa variante da exaltação do 'jeitinho brasileiro' (a crença de que se a lei não ajuda, vamos criar uma 'lei paralela') também é notada em situações onde uma pessoa inocente é morta por engano por policiais mercenários. Já ouvi jornalistas de grandes veículos de comunicação de São Paulo dizerem em casos assim que 'foi apenas um caso isolado', como se a perda de uma vida de um cidadão correto não fosse nada, perante à simbologia negativa que isso causa na instituição polícial. Esta banalização da 'violência contra a violência' é antiga no país, que o diga a Scuderie Le coq (também chamado de Esquadrão da Morte), famoso grupo que atuava à margem da lei no Rio dos anos 1960 e 1970 com ampla aprovação popular de seu caráter bandoleiro.
Tanto o discurso de Maitê onde um 'mal' - machismo - atacaria outro 'mal' - para Maitê, Dilma - quanto o da exaltação da 'lei' marginal - refletem uma dura realidade. A de que não aprendemos ainda que não se constrói justiça usando recursos condenáveis para atingir um objetivo, ou vencer um problema. Pensar somente em soluções imediatistas pode ser 'bom' em determinado momento, mas as consequências podem ser graves. Seja na vida pessoal ou pública, o jeitinho inocente de agora certamente pode trazer um problema difícil de resolver na frente. E ficará mais caro do que se dispensarmos tempo e energia para resolvê-lo agora de forma correta , dentro da lei e visando o bem comum.
*Marcos Vinicius Gomes é Professor de Língua inglesa e portuguesa, em São Paulo.
Fontes:
http://www2.uol.com.br/JC/_1998/1205/br1205n.htm
http://www.atarde.com.br/cultura/noticia.jsf?id=4737853
http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u122101.shtml
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