Alberto Magalhães*
O Estado é o guardião da ordem
pública e do bem estar social e deve providenciar tudo o que for necessário
para que o cidadão tenha preservados a sua saúde física e mental, a sua vida, a
sua integridade física, o seu patrimônio e a sua educação pela qual haverá o
eficiente médico, o professor, o juiz, o engenheiro, o legislador... Esses são
os serviços essenciais prestados pelo Estado e em seguida, o cidadão deve ter
ao seu dispor transporte, água e luz. Devemos lembrar que saneamento básico
consta do rol prioritário na assistência à saúde.
O que vemos diariamente no
Brasil, através da mídia, é o caos no transporte público e tantas comunidades
sem saneamento básico, água potável, luz elétrica, escola, posto de saúde e
delegacia de polícia operante. Vemos meliantes enfrentando a Polícia (portanto,
enfrentando o Estado) em guerrilhas, com fuzis e metralhadoras, invadir órgãos
de segurança para soltar criminosos e se apossar de armas do Estado, executar
policiais e outros agentes da autoridade estatal, contrabandear armamento de
grosso calibre em grande quantidade, explodir caixas eletrônicos, estabelecer e
consolidar o tráfico de drogas mais facilmente que indústrias e empresas legais
conseguem se estabelecer. Também vemos um número alarmante de homicídios,
roubos e menores inseridos na marginalidade.
Mas para demonstrar o
fragoroso fracasso do Estado brasileiro ainda falta o fator da impunidade e de
outro que falarei mais à frente. A impunidade não só é um mal que prestigia o
mal original, como também gera a perigosa cultura da vantagem pessoal. Ora se
outros se safam impunes eu também poderei sair impune, ou seja, eu também quero
esse benefício concedido historicamente aos que tiveram acesso ao poder ou ao
muito dinheiro.
A pressão social, no Brasil,
ao invés de acabar com a impunidade e a corrupção alargou a abrangência destes
entre os agentes públicos administrativos e políticos. No entanto os
lesa-pátria estão incomodados com os baderneiros nas manifestações populares.
Claro, eles não querem os holofotes apontando para a verdadeira baderna que
eles fazem com as finanças públicas. Eles que negam ao cidadão mais modesto a
oportunidade de ter dignidade social, sem a qual a dignidade humana fica
relegada a uma simples teoria.
Já o outro fator, o
ingrediente final, a cereja do chantilly do comprovado fracasso retumbante do
Estado brasileiro é a propagação pelas autoridades, constituídas para promover
a saúde, a segurança e a educação de que lhes faltam os recursos necessários
para cumprir o seu dever, para oferecer ao cidadão os direitos essenciais que
dão sentido a formação de uma sociedade civilizada, governada por um Estado
democrático de direito.
O carimbo do fracasso
aparece quando vemos um chefe de Estado (seja presidente ou governador) dizer
que não tem recursos suficientes para a saúde e a educação. Quando vemos um
gestor da pasta da saúde dizer que existe a grande demanda porque o povo adoece
demais ou que está vivendo mais – porém não vive melhor, por causa exatamente
da ineficiente política estatal de saúde. Quando o governo diz que no Brasil
não há médicos suficientes para atender a população.
Quando vemos os chefes ou
comandantes de polícia a toda hora falarem que não existem policiais
suficientes para dar segurança à população, mas “vão fazer um remanejamento de
policiais” para determinada área. Esses brilhantes “estadistas” vão tirar
policiais de onde? Dos 2 % que estão lotados em outros órgãos? Ora a defasagem
de efetivo é de 100 %, em geral. O mesmo acontece com relação a juízes e
promotores. Os processos se arrastam lentamente, ora em desfavor da sociedade,
nos crimes, ora em desfavor dos cidadãos, na área cível. Além do atraso doloso
do Estado – leia-se, gestores mal intencionados - em cumprir com a sua
responsabilidade de pagar os valores devidos.
O fracasso do Estado está anunciado
quando estudiosos do Brasil informam que existem mais de 100 mil criminosos
para serem presos – grande parte por vários mandados de prisão - e que em cada
100 criminosos que não são presos em flagrante apenas 20 deles são
identificados, 10 são presos e só cinco cumprem pena. Estou usando dados
“redondos”, aproximados. Resolvida essa demanda todo o efetivo – já defasado -
do judiciário precisará crescer vertiginosamente. O fracasso do Estado está
visível quando vemos faltarem celas para abrigar os que estão foragidos ou
prestes a delinquir, ou mesmo suficiente para os que já estão recolhidos no
sistema penitenciário.
Mas todo mundo sabe que há
recursos suficientes para todos esses serviços essenciais, sabe que boa parte
deles é desviado para os bolsos de gestores públicos da União, dos Estados e
dos Municípios, que os recursos são gastos com as mordomias e benesses desses
gestores, que os recursos são mal usados em obras superfaturadas e de má
qualidade - que logo se acabam e têm que ser feitas de novo, que também servem
para pagar os CCs de assessores políticos desnecessários, e em valores maiores
que pagos aos CCs técnicos, e que há gasto demasiado com a propaganda política
dos governos.
Quando temos conhecimento de
que existe mal uso dos recursos nas casas legislativas do país e em setores do
judiciário, e de que o Brasil permanece no topo da lista mundial de índices do
atraso e da injustiça social, depois de tanta luta de brasileiros contra a
ignorância, a pobreza e a desonestidade, na construção de uma identidade
nacional digna, nos vem a impressão de que já é tarde demais para reparar as
variadas mazelas impregnadas em nosso país pelo iníquo sistema político que nos
rege.
*Alberto Magalhães é
funcionário público do Estado de Sergipe e presidente do Centro de Estudos e
Ação para o Progresso Humano e Social – CEAPHS.
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