Marcos Vinicius Gomes*
A eleição da primeira mulher Presidente da República é algo notável, principalmente quando estamos adiante de países desenvolvidos como Estados Unidos, França e outros da Europa que ainda não tiveram chefes de Estado mulheres. E é mais notável ainda quando mesmo antes da sua posse, o nome de Dilma Rousseff já criou frisson entre as feministas, sexistas e a turma do 'exótico por natureza' que com seus discursos exaltados, seus brados históricos, suas frases lapidares nos deixam constrangidos e desmontam o ideal de progressismo que a eleição de uma mulher Presidente pode trazer.
As feministas, em particular, que pareciam sossegadas em seus textos contra o patriarcado, contra o serviço doméstico, contra os salários maiores dos homens em relação aos das mulheres, a favor do domínio irrestrito do corpo, ressurgiram do sono profundo. Dilma, numa situação inesperada, foi vítima da patrulha ideológica de suas próprias companheiras de partido. Numa plenária nacional de mulheres do PT uma de suas 'companheiras', Sueli de Oliveira, saiu-se com a observação: "Quando Dilma diz: 'Nós, mulheres, nascemos com o sentimento de cuidar, amparar e proteger. Somos imbatíveis na defesa de nossos filhos e de nossa família', valorizando estas funções como grande qualidade das mulheres, ela colabora com os valores do patriarcado e dos fundamentalistas na defesa de que lugar de mulher é na casa, no lar e na família".
Este é um exemplo da originalidade do pensamento feminista contemporâneo. E parece que vem mais por aí. Mas deve-se ressaltar que por mais que feministas e congêneres esperneiem, difundindo uma simbologia sexista nesta disputa eleitoral na qual Dilma saiu vitoriosa, houve nessa disputa algo inverso ao ideal daquelas que exigem de modo precário, o igualitarismo de gêneros. Basta observar a trajetória política recente de Dilma Rousseff - chamada para assumir a Chefia da Casa Civil num período de crise, criou uma relação de confiança com o presidente Lula e assim se estabeleceu a estrutura para uma possível sucessão ao fim do mandato do presidente-operário. Houve dentro desse processo muita crítica míope, mais por causa de incompetência da oposição do que por limitações da ministra preferida de Lula. Claro que limitações, Dilma tem, mas tem se empenhado e os resultados são visíveis - um melhor diálogo e uma melhor desenvoltura, apesar de ainda pecar nos jargões econômicos, e o sucesso na reorganização da imagem de 'durona' que foi abrandada.
Porém o mais importante é a simbologia de harmonização entre os dois sexos vista na relação entre Lula e Dilma; é impossível não notar nos discursos a cumplicidade entre os dois, algo até mesmo raro entre relações matrimoniais. A troca de olhares que mostravam confiança, a sintonia entre eles, o respeito mútuo. Lula confiou em Dilma e ela confiou nele, sem melindres ou egocentrismos. E para isso, não foi preciso o hasteamento de bandeiras narcisistas o discurso preconceituoso-sem-querer-ser do tipo 'ela trará um toque de sensibilidade ao governo...' (isso faz lembrar da ex-prefeita e ícone feminista Marta Suplicy e seu Projeto Belezura que plantava coqueiros em bairros chiques, enquanto os bairros não nobres afundavam nas enchentes). Todo este processo talvez provoque incômodo na turma dos ideais fumegantes, das burocratas do pensamento feminista - professoras de sociologia e de humanas, diretoras de ongs que mamam gostosas verbas públicas para vislumbrar o vazio e descrevê-lo como quem diz algo substancialmente importante.
Enfim, parece que Dilma não fez e não deverá fazer coro com 'as companheiras'. Dilma talvez não aguentasse dez minutos de conversa com Betty Friedan (a papisa do feminismo), acharia a messiânica dona de casa que livrou as mulheres do jugo machista uma desvairada a procura de platéia. A futura presidente pediria licença da conversa, indo fazer o que mais sabe fazer - tratar de assuntos de que domina, dando o melhor de si, sem preocupar-se com bordões e panfletagens que não indicam um caminho, uma saída. Iria mostrar serviço, honrar o voto de confiança de mulheres, homens, jovens, gente que sente no dia-a-dia a necessidade de se construir um país melhor, distribuir a renda, observar os gastos. Resumindo, pôr a casa em ordem. Esperamos que a futura presidente utilize seus conhecimentos da área econômica e saiba cuidar do orçamento 'da casa de quase 190 milhões de habitantes', para desespero das feministas, mais preocupadas com o discurso 'socialista-Channel' e a retórica de degradação das relações dos gêneros.
*Marcos Vinicius Gomes é Professor de Língua Portuguesa e Inglesa em São Paulo.
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