Anne Danielle Magalhães
Saudade é quando a gente manda uma coisa sair de nosso coração, mas ela não vai embora: ao invés disso, deita no sofá, liga a televisão e nos pede um cafuné, bem esparramada em nossa vida. Eu sei que daqui a dez anos vou sentir saudade das coisas que estão acontecendo agora. É sempre assim, não é? Tudo o que a gente faz (ou tenta fazer) é para que os outros tenham saudade da gente e nos queiram sempre por perto. Nos querendo sempre por perto, farão de tudo para nos magoar menos, nos decepcionar menos. Às vezes não conseguem, porque são humanos e, portanto, falhos. Assim nos afastamos, até que essas pessoas se acostumem a ter saudade da gente e não lutem mais por nós, e se acomodem, e apenas lembrem com um brilho no olhar os bons momentos que vivemos juntos.
Queria deixar a saudade como algo precioso, só pras pessoas que já partiram. Como é estranho sentir saudade de uma pessoa que está perto da gente (vale na mesma cidade)! Por que eu simplemente não telefono, e digo: "Ei, estou sentindo sua falta! Vamos sair uma tarde dessas para tomar um sorvete e conversarmos?". Ah... mas essas mágoas... mas essas decepções que temos... Elas tentam estragar o plano. Eu já magoei, já decepcionei. E foi tão bom dar um abraço do tamanho do mundo inteiro depois disso! Que coisa sem preço é se sentir perdoado. Saber que aquela pessoa te quer junto apesar de quem você é. Mas que coisa linda que é o perdão! Ele consegue fazer a saudade não ser eterna. Do que é que você tem saudade? Voltar não é regredir.
Que coisa chata que seria o mundo sem a saudade! Como é que a gente iria saber se algo foi realmente bom se não sentíssemos nem um pouquinho a sua falta? Que coisa mais estranha que seria a vida se a gente não sentisse falta das pessoas! Como é que iríamos tentar não decepcioná-las? Se, por acaso, acontecer de você não poder de jeito nenhum voltar e matar a saudade (o que acho muito difícil, só em casos extremos mesmo), não tem problema: vá tratar de construir coisas tão especiais como aquelas :
Quando eu era criança, eu subia no alto de alguma coisa e me jogava no ar, porque os braços do meu pai estavam abertos pra me segurar. Eu confiava simplesmente, eu sabia que ele estava ali e isso bastava. Eu fazia muitos castelinhos de areia na praia, e enfeitava com tampinhas e canudos.
Então uma onda vinha e derrubava tudo. Mas eu nem ligava. Apenas sorria e começava a construir outro castelo, dizendo em voz alta que o faria ainda maior e mais bonito. Confiar e sempre começar de novo. Hoje eu tenho essa saudade: de ser a criança que eu era.
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